O Domingo dói. Hoje, ao contrário do que antes sucedia, não chovia quando te deixei. Nem choveu no caminho. Um Sol radioso inundava o carro. Apenas os montes, as minhas testemunhas, imponentes e aparentemente frias, de há uns anos a esta parte, pareciam tristes, cobertos de negras nuvens, como se percebessem outra vez como eu estava por dentro. Na rádio, as músicas do éter pareciam escolhidas a dedo para acentuar a tua presença invisível ao meu lado. E quando o Domingo dói não vale a pena insistir que a segunda-feira é um novo começo. Ele dói. Porque eu quero que doa. Isto é, recuso conformar-me com a nova caminhada que começarei amanhã sem ti ao alcance dos meus olhos, do meu nariz, da minha boca, da minha pele. E como me senti dono do mundo na sexta-feira! Quando me beijaste a céu aberto onde antes te raptava para te amar de noite e longe. Quando entrei em tua casa como se fosse a minha, onde antes olhava de soslaio para ver se estava a ser visto. Uma estranha sensação erótica, de posse, se apossou de mim quando peguei na chave escondida debaixo do tapete e entrei. Senti-me como se estivesse novamente a entrar em ti, na tua alma, no teu sentimento, no teu corpo, na tua vida. E não há, felizmente, Domingo nenhum que me tire essa sensação de grandeza que vivi.
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